Eu amo os animais e a natureza, certamente porque passei boa parte da minha infância no campo. Meus avós maternos e paternos são naturais de pequenas vilas onde passávamos nossos verões todos os anos, colhendo frutas frescas, degustando-as e preparando receitas familiares com o que vinha da terra.
A vivência no campo definitivamente não me é estranha. Me divertia ao observar meu avô criando galinhas e porcos, além do cavalo, o Gniady, e uma vaca, seu animal favorito e motivo de piadas, pois todos diziam que a vaca lhe era mais familiar que nós. De todo jeito, são meus cães quem verdadeiramente me fazem amar todos os animais.
As lembranças dos verões em família terminam em algum lugar entre a sexta e a sétima série do ensino fundamental. E não é como se eu estivesse tentando negar algo ou fingir que não aconteceu. Simplesmente não me lembro de muita coisa. Não me recordo de pessoas, eventos ou lugares. Dessa época, só recordo perfeitamente do momento em que percebi que havia algo diferente em mim e que essa sensação me destruía completamente.
Hoje, sei que provavelmente estava com depressão. Na época, porém, pensei que só precisava de um plano. Ele veio muito rapidamente e me pareceu extremamente simples. Fui bastante prático e, como em qualquer boa estratégia, defini as razões, os passos e o fim, que seria em algum lugar no final do ensino médio, antes dos exames finais.
Ironicamente, esse plano me ajudou, de alguma forma, a sobreviver a esse período da adolescência. Não é como se eu não quisesse viver, mas eu simplesmente sabia que eu não daria conta de lidar com isso.
Como todos os adolescentes, tive minhas dúvidas e hesitações. O fato de que tudo terminaria logo me deu coragem. Um elemento favorável foi a localização do apartamento onde morávamos, perto dos trilhos. Todos na minha cidade moram perto dos trilhos da ferrovia. Me parecia essa a melhor ideia, afinal, o impacto do trem seria mais efetivo e falhar era o que eu mais temia.
Próximo ao momento ideal para executá-lo, Misiek apareceu na minha vida. Misiek era o cão mais maravilhoso do mundo, enorme, um pastor misturado, muito provavelmente, com um elefante. Ele era realmente ótimo e extremamente gentil. Nossos passeios noturnos começaram, sempre perto dos trilhos.
Não consigo contar na minha cabeça quantas vezes saí de casa pensando que era a última vez e, sempre segurando a coleira do Misiek, pensava que esse pobrezinho não voltaria para casa sozinho, deixando, assim, meu plano para o dia seguinte, prometendo que sairia sozinho.
Misiek sempre atrapalhava. Tinha vontade de fazer xixi e eu não podia recusar. Por causa dele, adiei por meses a conclusão do plano. Era quando eu me odiava mais. Eu odiava a minha covardia e eu mal conseguia executar um plano tão simples e bem construído.
Enfim, não sei como passei nos estudos. Não sei como cheguei à universidade. Nada disso estava no plano. Alguns anos depois, morando em Poznan, liguei para minha mãe pedindo que prestasse atenção no Misiek.
Nunca me esqueço desse dia, quando me bateu um mau pressentimento de que o cão precisava de uma atenção especial. Não sabia explicar, apenas sentia. Isso fez minha mãe pensar que eu estava bem louco. Três dias depois, fui visitar meus pais. Misiek se foi. Correu para os trilhos logo depois de eu ligar para minha mãe. Eu senti raiva. Era para ter sido eu….
Sei que muitos de vocês agora têm filhos pequenos ou adolescentes. Diga a eles que você os ama, diga a eles como eles são importantes e que não existe nada que vocês não possam superar juntos.
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